Outras Fontes e Novas Verdades Acerca da Ditadura Civil-Militar Brasileira
Canções Censuradas
Lançada em 1968, Pra não dizer que não falei das flores, após perder no Festival da Canção do referido ano, tornou-se hino da resistência ao regime ditatorial. Com o estouro da canção, Geraldo Vandré programou uma série de apresentações em conjunto com o grupo Quarteto Livre, que tinha entre seus integrantes Geraldo Azevedo, Naná Vasconcelos, Nelson Ângelo e Franklin. Foi justamente depois de um desses espetáculos que aconteceu um dos atentados de maior repercussão durante o governo militar. Uma bomba explodiu no camarim do artista logo após sua saída, não houve feridos. O espetáculo de Vandré foi proibido com a afirmação do AI-5, assim, o compositor exilou-se, com passaporte falso, no Paraguai e, logo em seguida, no Chile.
*A versão aqui disponível é o áudio original do Segundo Festival Internacional da Canção, com pequeno discurso do artista antes da música propriamente dita. As imagens referentes ao áudio foram destruídas pela censura em 1979.
**Devido à sua importância para o movimento cultural e político durante o período ditatorial, Vandré foi escolhido por nós para estampar a capa do site.
Pra não dizer que não falei das flores - Geraldo Vandré
Caminhando e cantando e seguindo a canção
Somos todos iguais, braços dados ou não
Nas escolas, nas ruas, campos, construções
Caminhando e cantando e seguindo a canção
Vem, vamos embora que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora não espera acontecer
Pelos campos a fome em grandes plantações
Pelas ruas marchando indecisos cordões
ainda fazem da flor seu mais forte refrão
e acreditam nas flores vencendo o canhão
Vem, vamos embora que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora não espera acontecer
Há soldados armados, amados ou não
Quase todos perdidos de armas na mão
Nos quartéis lhes ensinam a antiga lição
de morrer pela pátria e viver sem razão
Vem, vamos embora que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora não espera acontecer
Nas escolas, nas ruas, campos construções
Somos todos soldados armados ou não
Caminhando e cantando e seguindo a canção
Somos todos iguais, braços dados ou não
Os amores na mente, as flores no chão
A certeza na frente, a história na mão
Caminhando e cantando e seguindo a canção
Aprendendo e ensinando uma nova lição
Cálice - Chico Buarque e Gilberto GIl
Pai! Afasta de mim esse cálice
Pai! Afasta de mim esse cálice
Pai! Afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue
Pai! Afasta de mim esse cálice
Pai! Afasta de mim esse cálice
Pai! Afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue
Como beber dessa bebida amarga
Tragar a dor e engolir a labuta?
Mesmo calada a boca resta o peito
Silêncio na cidade não se escuta
De que me vale ser filho da santa?
Melhor seria ser filho da outra
Outra realidade menos morta
Tanta mentira, tanta força bruta
Pai! Afasta de mim esse cálice
Pai! Afasta de mim esse cálice
Pai! Afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue
Como é difícil acordar calado
Se na calada da noite eu me dano
Quero lançar um grito desumano
Que é uma maneira de ser escutado
Esse silêncio todo me atordoa
Atordoado eu permaneço atento
Na arquibancada, prá a qualquer momento
Ver emergir o monstro da lagoa
Pai! Afasta de mim esse cálice
Pai! Afasta de mim esse cálice
Pai! Afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue
De muito gorda a porca já não anda (Cálice!)
De muito usada a faca já não corta
Como é difícil, Pai, abrir a porta (Cálice!)
Essa palavra presa na garganta
Esse pileque homérico no mundo
De que adianta ter boa vontade?
Mesmo calado o peito resta a cuca
Dos bêbados do centro da cidade
Pai! Afasta de mim esse cálice
Pai! Afasta de mim esse cálice
Pai! Afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue
Talvez o mundo não seja pequeno (Cale-se!)
Nem seja a vida um fato consumado (Cale-se!)
Quero inventar o meu próprio pecado (Cale-se!)
Quero morrer do meu próprio veneno (Pai! Cale-se!)
Quero perder de vez tua cabeça! (Cale-se!)
Minha cabeça perder teu juízo. (Cale-se!)
Quero cheirar fumaça de óleo diesel (Cale-se!)
Me embriagar até que alguém me esqueça (Cale-se!)
Lançada em 1973, Cálice, de autoria de Chico Buarque de Hollanda e Gilberto Gil, faz parte dessas músicas que não passaram pelo crivo da censura. Mesmo com a letra vetada, Chico e Gil tentaram cantá-la no evento Phono 73: O canto de um povo, balbuciando a melodia, apenas, e os trechos em que a palavra cálice era pronunciada. A tentativa, porém, fracassou, pois os microfones foram desligados e as vozes de Chico e Gil “caladas”, segundo Janaina de Holanda Costa Calazans, Doutora em Comunicação Social pela Universidade Federal de Pernambuco.
*A versão aqui mostrada tem a participação de Milton Nascimento no lugar de Gilberto Gil.
**Logo abaixo, vídeo original da apresentação no Phono 73.
***Por último, entrevista em que Gilberto Gil explica o processo criativo da canção.
Depois que Geraldo Vandré foi exilado, Chico Buarque se tornou o artista mais odiado pelo governo militar, tendo dezenas de músicas censuradas. Apesar de você foi lançada em 1970, durante o governo do general Médici. Por conta disso, por muito se pensou que a letra fazia uma alusão a este ditador, entretanto, em entrevista recente, Chico afirma que o “você” era toda a situação a qual a população estava sujeita. Para driblar a censura, ele afirmou que a música contava a história de uma briga de casal, cuja esposa era muito autoritária. A desculpa funcionou e o disco foi gravado, mas os oficiais do exército perceberam a real intenção e a canção foi proibida de tocar nas rádios, mais de cem mil cópias já tinham sido vendidas. Destruí-las rendeu trabalho aos censores.
*Aqui apresentamos duas versões da canção. A primeira delas é apresentação de Chico com o grupo MPB4 no programa "Ensaio" da TV Tupi, em 1971. A segunda é versão mais atual do áudio (com melhor qualidade) acompanhada de montagem com várias imagens da época.
Apesar de você - Chico Buarque
Hoje você é quem manda
Falou, tá falado
Não tem discussão
A minha gente hoje anda
Falando de lado
E olhando pro chão, viu
Você que inventou esse estado
E inventou de inventar
Toda a escuridão
Você que inventou o pecado
Esqueceu-se de inventar
O perdão
Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia
Eu pergunto a você
Onde vai se esconder
Da enorme euforia
Como vai proibir
Quando o galo insistir
Em cantar
Água nova brotando
E a gente se amando
Sem parar
Quando chegar o momento
Esse meu sofrimento
Vou cobrar com juros, juro
Todo esse amor reprimido
Esse grito contido
Este samba no escuro
Você que inventou a tristeza
Ora, tenha a fineza
De desinventar
Você vai pagar e é dobrado
Cada lágrima rolada
Nesse meu penar
Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia
Inda pago pra ver
O jardim florescer
Qual você não queria
Você vai se amargar
Vendo o dia raiar
Sem lhe pedir licença
E eu vou morrer de rir
Que esse dia há de vir
Antes do que você pensa
Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia
Você vai ter que ver
A manhã renascer
E esbanjar poesia
Como vai se explicar
Vendo o céu clarear
De repente, impunemente
Como vai abafar
Nosso coro a cantar
Na sua frente
Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia
Você vai se dar mal
Etc. e tal
O Bêbado e a Equilibrista - Elis Regina
Caía a tarde feito um viaduto
E um bêbado trajando luto
Me lembrou Carlitos
A lua, tal qual a dona do bordel,
Pedia a cada estrela fria
Um brilho de aluguel
E nuvens, lá no mata-borrão do céu,
Chupavam manchas torturadas, que sufoco!
Louco, o bêbado com chapéu-coco
Fazia irreverências mil pra noite do Brasil.
Meu Brasil
Que sonha com a volta do irmão do Henfil.
Com tanta gente que partiu num rabo de foguete.
Chora a nossa pátria mãe gentil,
Choram Marias e Clarisses no solo do Brasil.
Mas sei que uma dor assim pungente
Não há de ser inutilmente, a esperança
Dança na corda bamba de sombrinha
E em cada passo dessa linha pode se machucar
Azar, a esperança equilibrista
Sabe que o show de todo artista
Tem que continuar...
O bêbado e a Equilibrista, foi composto por Aldir Blanc e João Bosco e gravado por Elis Regina, em 1979. Representava o pedido da população pela anistia ampla, geral e irrestrita, um movimento consolidado no final da década de 70. A letra fala sobre o choro de Marias e Clarisses, em alusão às esposas do operário Manuel Fiel Filho e do jornalista Vladimir Herzog, assassinados sob tortura pelo exército.
Lançada em 1967 por Caetano Veloso, Alegria, Alegria valorizava a ironia, a rebeldia e a anarquia a partir de fragmentos do dia-a-dia. Em cada verso, revelações da opressão ao cidadão em todas as esferas sociais. A letra critica o abuso do poder e da violência, as más condições do contexto educacional e cultural estabelecido pelos militares, aos quais interessava formar brasileiros alienados.
Foi apresentada pela primeira vez no Festival da Canção de 1967. Por surgir no palco acompanhado dos argentinos dos Beat Boys e trajando roupas “americanizadas”, bem como em porte de uma guitarra elétrica, Caetano foi vaiado. Entretanto, ao longo da apresentação o público foi “comprando” a música é ao fim já cantava junto e aplaudia.
*A versão aqui presente é retirada do documentário “Uma noite em 67”, o qual trata do referido Festival. Inicialmente, há comentário de Nelson Motta sobre a performance, seguido da própria e para finalizar, Caetano fala da obra.
Alegria, Alegria - Caetano Veloso
Caminhando contra o vento
Sem lenço, sem documento
No sol de quase dezembro
Eu vou
O sol se reparte em crimes,
Espaçonaves, guerrilhas
Em cardinales bonitas
Eu vou
Em caras de presidentes
Em grandes beijos de amor
Em dentes, pernas, bandeiras
Bomba e Brigitte Bardot
O sol nas bancas de revista
Me enche de alegria e preguiça
Quem lê tanta notícia
Eu vou
Por entre fotos e nomes
Os olhos cheios de cores
O peito cheio de amores vãos
Eu vou
Por que não, por que não
Ela pensa em casamento
E eu nunca mais fui à escola
Sem lenço, sem documento,
Eu vou
Eu tomo uma coca-cola
Ela pensa em casamento
E uma canção me consola
Eu vou
Por entre fotos e nomes
Sem livros e sem fuzil
Sem fome sem telefone
No coração do Brasil
Ela nem sabe até pensei
Em cantar na televisão
O sol é tão bonito
Eu vou
Sem lenço, sem documento
Nada no bolso ou nas mãos
Eu quero seguir vivendo, amor
Eu vou
Por que não, por que não…
Acender as velas - Zé Kéti
Acender as velas
Já é profissão
Quando não tem samba,
Tem desilusão
Acender as velas
Já é profissão
Quando não tem samba,
Tem desilusão
É mais um coração
Que deixa de bater
Um anjo vai pro céu
Deus me perdoe, mas vou dizer
Deus me perdoe, mas vou dizer
O doutor chegou tarde demais
Porque no morro não tem automóvel pra subir
Não tem telefone pra chamar
E não tem beleza pra se ver
E a gente morre sem querer morrer
E a gente morre sem querer morrer
A música Acender as velas, lançada em 1965, é considerada uma das maiores composições do sambista Zé Keti. A letra deste samba possui um impacto forte, criado pelo relato dramático do dia-a-dia da favela. Faz uma crítica social às péssimas condições de vida nos morros do Rio de Janeiro, na década de 1960 e por conta disso foi vetada pela censura.
Composta em 1979, por Renato Russo, Faroeste Caboclo precisou de alterações na letra para poder passar pela censura. Seus palavrões tiveram que ser cobertos por um “bip” ou cortados pelas emissoras para que houvesse a radiodifusão. Mesmo assim, a Legião Urbana só conseguiu lançar a canção no álbum Que País é Este, de 1987.
Apesar de contar uma história fictícia, escrita em duas tardes, sem planejamento algum, a canção se tornou um hino para a juventude da época, imortalizando a banda.
*O vídeo é do programa de TV “Globo de Ouro” de 1988.
Faroeste Caboclo - Legião Urbana
Não tinha medo o tal João de Santo Cristo
Era o que todos diziam quando ele se perdeu
Deixou pra trás todo o marasmo da fazenda
Só pra sentir no seu sangue o ódio que Jesus lhe deu
Quando criança só pensava em ser bandido
Ainda mais quando com um tiro de soldado o pai morreu
Era o terror da cercania onde morava
E na escola até o professor com ele aprendeu
Ia pra igreja só pra roubar o dinheiro
Que as velhinhas colocavam na caixinha do altar
Sentia mesmo que era mesmo diferente
Sentia que aquilo ali não era o seu lugar
Ele queria sair para ver o mar
E as coisas que ele via na televisão
Juntou dinheiro para poder viajar
De escolha própria escolheu a solidão
Comia todas as menininhas da cidade
De tanto brincar de médico aos doze era professor
Aos quinze foi mandado pro reformatório
Onde aumentou seu ódio diante de tanto terror
Não entendia como a vida funcionava
Descriminação por causa da sua classe e sua cor
Ficou cansado de tentar achar resposta
E comprou uma passagem foi direto a Salvador
E lá chegando foi tomar um cafezinho
E encontrou um boiadeiro com quem foi falar
E o boiadeiro tinha uma passagem
Ia perder a viagem mas João foi lhe salvar
Dizia ele - Estou indo pra Brasília
Nesse país lugar melhor não há
Tô precisando visitar a minha filha
Eu fico aqui e você vai no meu lugar
E João aceitou sua proposta
E num ônibus entrou no Planalto central
Ele ficou bestificado com a cidade
Saindo da rodoviária viu as luzes de natal
Meu Deus mas que cidade linda!
No Ano Novo eu começo a trabalhar
Cortar madeira aprendiz de carpinteiro
Ganhava cem mil por mês em Taguatinga
Na sexta feira ia pra zona da cidade
Gastar todo o seu dinheiro de rapaz trabalhador
E conhecia muita gente interessante
Até um neto bastardo do seu bisavô
Um peruano que vivia na Bolívia
E muitas coisas trazia de lá
Seu nome era Pablo e ele dizia
Que um negócio ele ia começar
E Santo Cristo até a morte trabalhava
Mas o dinheiro não dava pra ele se alimentar
E ouvia às sete horas o noticiário
Que sempre dizia que seu ministro ia ajudar
Mas ele não queria mais conversa
E decidiu que como Pablo ele iria se virar
Elaborou mais uma vez seu plano santo
E sem ser crucificado a plantação foi começar
Logo, logo os maluco da cidade
Souberam da novidade
Tem bagulho bom aí!
E o João de Santo Cristo ficou rico
E acabou com todos os traficantes dali
Fez amigos, frequentava a Asa Norte
Ia pra festa de Rock pra se libertar
Mas de repente
Sob uma má influência dos boyzinhos da cidade
Começou a roubar
Já no primeiro roubo ele dançou
E pro inferno ele foi pela primeira vez
Violência e estupro do seu corpo
Vocês vão ver, eu vou pegar vocês!
Agora Santo Cristo era bandido
Destemido e temido no Distrito Federal
Não tinha nenhum medo de polícia
Capitão ou traficante, playboy ou general
Foi quando conheceu uma menina
E de todos os seus pecados ele se arrependeu
Maria Lúcia era uma menina linda
E o coração dele pra ela o Santo Cristo prometeu
Ele dizia que queria se casar
E carpinteiro ele voltou a ser
Maria Lúcia pra sempre vou te amar
E um filho com você eu quero ter
O tempo passa
E um dia vem na porta um senhor de alta classe com
Dinheiro na mão
E ele faz uma proposta indecorosa
E diz que espera uma resposta, uma resposta de João
Não boto bomba em banca de jornal
Nem em colégio de criança
Isso eu não faço não
E não protejo general de dez estrelas
Que fica atrás da mesa com o cu na mão
E é melhor o senhor sair da minha casa
E nunca brinque com um peixes de ascendente escorpião
Mas antes de sair com ódio no olhar
O velho disse
Você perdeu a sua vida, meu irmão!
Você perdeu a sua vida, meu irmão!
Você perdeu a sua vida, meu irmão!
Essas palavras vão entrar no coração
Eu vou sofrer as consequências como um cão
Não é que o Santo Cristo estava certo
Seu futuro era incerto
E ele não foi trabalhar
Se embebedou e no meio da bebedeira
Descobriu que tinha outro trabalhando em seu lugar
Falou com Pablo que queria um parceiro
Que também tinha dinheiro e queria se armar
Pablo trazia o contrabando da Bolívia
E Santo Cristo revendia em Planaltina
Mas acontece que um tal de Jeremias
Traficante de renome apareceu por lá
Ficou sabendo dos planos de Santo Cristo
E decidiu que com João ele ia acabar
Mas Pablo trouxe uma Winchester 22
E Santo Cristo já sabia atirar
E decidiu usar a arma só depois
Que Jeremias começasse a brigar
Jeremias maconheiro sem vergonha
Organizou a Rockonha e fez todo mundo dançar
Desvirginava mocinhas inocentes
E dizia que era crente mas não sabia rezar
E Santo Cristo há muito não ia pra casa
E a saudade começou a apertar
Eu vou me embora, eu vou ver Maria Lúcia
Já está em tempo de a gente se casar
Chegando em casa então ele chorou
E pro inferno ele foi pela segunda vez
Com Maria Lúcia Jeremias se casou
E um filho nela ele fez
Santo Cristo era só ódio por dentro
E então o Jeremias pra um duelo ele chamou
Amanhã, as duas horas na Ceilândia
Em frente ao lote catorze é pra lá que eu vou
E você pode escolher as suas armas
Que eu acabo mesmo com você, seu porco traidor
E mato também Maria Lúcia
Aquela menina falsa pra quem jurei o meu amor
E Santo Cristo não sabia o que fazer
Quando viu o repórter da televisão
Que deu notícia do duelo na Tv
Dizendo a hora o local e a razão
No sábado, então as duas horas
Todo o povo sem demora
Foi lá só pra assistir
Um homem que atirava pelas costas
E acertou o Santo Cristo
E começou a sorrir
Sentindo o sangue na garganta
João olhou pras bandeirinhas
E o povo a aplaudir
E olhou pro sorveteiro
E pras câmeras e a gente da Tv filmava tudo ali
E se lembrou de quando era uma criança
E de tudo o que vivera até ali
E decidiu entrar de vez naquela dança
Se a Via-Crucis virou circo, estou aqui
E nisso o sol cegou seus olhos
E então Maria Lúcia ele reconheceu
Ela trazia a Winchester 22
A arma que seu primo Pablo lhe deu
Jeremias, eu sou homem. Coisa que você não é
E não atiro pelas costas, não
Olha prá cá filho da puta sem vergonha
Dá uma olhada no meu sangue
E vem sentir o teu perdão
E Santo Cristo com a Winchester 22
Deu cinco tiros no bandido traidor
Maria Lúcia se arrependeu depois
E morreu junto com João, seu protetor
O povo declarava que João de Santo Cristo
Era santo porque sabia morrer
E a alta burguesia da cidade não acreditou na história
Que eles viram da Tv
E João não conseguiu o que queria
Quando veio pra Brasília com o diabo ter
Ele queria era falar com o presidente
Pra ajudar toda essa gente que só faz sofrer!